quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Um homem simples

Um dia ele veio, com seu caminhar lento, caminhar de quem já andou muito na vida, de quem já palmilhou esta terra como ninguém.
Veio com seu jeito simples e tranqüilo, de poucas palavras e olhar profundo. Nas mãos, um pacotinho, e dentro um papel amarelado pelo tempo e uma fotografia, cópia de outra muito antiga que já se perdeu. Fiquei olhando suas mãos “grosseiras” retirando o conteúdo do pacote, as mesmas mãos que já plantaram balizas por esta terra, já ajustaram a velha bússola incontáveis vezes, na ânsia de dar um rumo à sua própria existência!
O conteúdo era um retrato seu quando jovem, no Rio de Janeiro, onde foi trabalhar em 1949! A cópia do retrato de sua carteira de trabalho: era projetor de filmes de uma grande empresa de cinema na Cidade Maravilhosa! E quão maravilhosa não devia ser aquela terra, sem a violência instituída que lá vemos hoje! Imagino o jovem quieto, tímido, do interior de Santa Catarina, na Lapa carioca, bairro boêmio onde morou. Gostava dos passeios de bonde sobre os Arcos da Lapa (e pensar que décadas mais tarde também me aventurei por aquelas terras!).
Contou que assim que juntou um “dinheirinho”, tratou de comprar uma bússola. Mas outra bússola, a do coração, também apontava para o sul: aqui havia ficado a bela que não abandonava seus pensamentos... E assim, voltou...
Na volta pôs em prática o ofício de agrimensor, cujo avô havia lhe ensinado anos antes. Conheceu estas terras como a palma das mãos! Acordava muito cedo todos os dias e, na companhia de sua velha bicicleta, cruzava esta região medindo tudo. Ofício que ajudou a sustentar seus nove filhos, família que constitui com a jovem que o fez voltar.
O outro conteúdo do “pacotinho” que ele trouxe era seu boletim de escola complementar, do segundo ano! Documento original, num papel amarelado pelo tempo, onde ficou registrado seu desempenho escolar. Fiquei surpresa com as notas! Ele era muito bom em música, desenho, ciências físicas e naturais, francês...

Fiquei feliz ao conhecer um pouco mais da história deste homem simples e quieto.
Este homem simples que aprendi a amar tem 82 anos. Um homem simples chamado Alfredo.
Este homem simples e especial é meu pai!

Bia Cardeal


Um comentário:

  1. Ai! Ai! Li, adorei, me emocionei e chorei...
    Lembro dele na bicicleta...que post mais lindo!! E que bonita as fotos...Dessa juncao so podia ter saido filhos especiais como vcs. Adoro a tua familia, apesar de ser mais apaixonada por ti que chegastes depois. Bjs.

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